inteligência - fraude - divergências
Pode
ser clichê que eu comece dizendo que escrevo estas palavras em um caderno de
folhas amareladas, à lápis, em pleno 2023, em meio a tanta tecnologia,
aparelhos e aplicativos – alguns até oferecem inteligência artificial para
completar uma frase, ainda que eu prefira o padecer de pensar. Também não seria
estranho que, em meio a tantos pensamentos, eu me questionasse sobre a
inteligência – a minha própria. Ora, tantas vezes já debochei de mim mesma
internamente por não entender muito sobre programação, mas achar que rabiscar
alguns versos era inteligência. E, não é?
Não
quero que me entendam mal, não sou uma destas pessoas alheias à tecnologia e às
redes sociais. Estas, por vezes, me irritam e me sufocam, é bem verdade,
entretanto ainda não consegui abandoná-las por completo e tornar-me, como dizem
um dos muitos jargões em inglês utilizados contemporaneamente, uma pessoa “low
profile”. Também não sou uma crítica ferrenha dos que leem em telas, apesar
de eu mesma não conseguir fazê-lo de forma eficaz. Acredito que o fato de
estarem lendo em meio ao caos de um mundo visto através de vídeos curtos já é
uma glória, não tirar-lhes-ei o mérito.
Porque,
SIM, qualquer leitura é importante. Percebo que soei como uma professora do
ensino fundamental nesta fala, tentando argumentar com pré-adolescentes as
razões pelas quais eles deveriam visitar mais frequentemente a biblioteca da
escola. Bom, peço novamente que não me julguem, também é meu lugar de fala, já
que leciono há catorze anos. Voltando à afirmação, é através da leitura que
conseguimos escrever; é conhecendo as palavras, interpretando figuras de
linguagem que conseguimos nos expressar melhor. Ah, e quantas vezes uma dúvida
pairou sobre minha mente, questionando se isso realmente era inteligência ou
mera obrigação. Sinto-me até envergonhada em dizê-lo aqui, sendo eu uma amante
das letras.
A
questão é que estamos muito acostumados a associar conhecimento como forma de
gerar renda, apenas. Maldito capitalismo que corrompe nossa visão e tira o brio
daqueles que são inclinados às artes! Que culhões tenho eu, perante o mundo,
para dizer que a estrofe de um poema necessita de tanta inteligência para ser
escrita quanto um código de programação? Chega a ser um sentimento de fraude,
de autossabotagem ferrenha, mas que esconde lá no fundo uma certa razão.
Isso
também não quer dizer que os versos de hoje em dia não despertariam a risada
irônica de Lord Byron ou finalmente consumiriam (de raiva) o coração de Percy
Shelley. A métrica, as rimas e os ritmos foram há muito esquecidos por aqueles
que têm pressa de escrever uma frase instagramável em três linhas, vendendo-a
como um devaneio disfarçado de poema. Perdoem-me, mestres da lírica, mas tais
escritas são necessárias como iscas na tentativa de fisgar uns e outros e
captura-los dentro do mundo da literatura.
Em
um mundo de pressas, espantar-me-ei com aqueles que chegarem até este ponto do
meu texto. Todos estão embriagados pela urgência do fazer, do ter e do parecer
que mal têm tempo para sentir, quiçá expressarem-se. Cada linha conta, afinal.
E eu, tão avessa a tais circunstâncias, me vejo impelida a retirar esses
pensamentos daqui do papel e transferi-los para algum dispositivo, mostrando-os
nas telas de alguns poucos leitores que se atreverão a mergulhar nas linhas e
entrelinhas, esperando que um ou dois deles reflitam, ao menos, que palavras
são arte, e arte é, sem dúvidas – mas com muitos julgamentos - uma forma legítima de inteligência.
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