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sexta-feira, 3 de fevereiro de 2023

Mar

 


Nos seus olhos há um mar

Intenso, infinito

É o mais bonito

Que eu poderia encontrar

 

É um mar adocicado

Como não podem ser

Os mares que seus olhos costumam ver

E que te deixam impressionado

 

Mar de águas escuras

Com refletância cristalina

Deixa leve tudo que ilumina

Acalma a mais feroz das criaturas

 

Olhando para este mar

Conheci o que é amar.

É uma rima tão pobre

Para um sentimento tão nobre

Porém nada mais conseguiria representar

 

Seu olhos, mar de amor

Têm o mais doce sabor

Que me faz afirmar:

São melhores que qualquer outro mar.

-E eu nunca vi um mar.



 Tany ~ 08/06/2018 (para Matheus)

Você morreria feliz?

 

Você acorda um dia e sente dores. Dores nas pernas, nas costas, nas mãos. Você espera que elas sejam breves, mas descobre que elas não têm intenção de abandoná-lo tão cedo. Você vai a vários médicos e eles lhe bombardeiam com nomes como “artrite”, “reumatismo” e “artrose”. Você percebe que ficou velho.

Você se lembra dos anos que passaram. Vêm à tona memórias da turma do futebol, da primeira namorada, da vez em que você que você quebrou o braço, da sua formatura, dos colegas da faculdade, do primeiro emprego, da primeira demissão, do seu casamento e do nascimento de cada um de seus filhos e netos.  Você quer voltar no tempo e reviver cada um desses momentos, mas lhe ocorre que eles agora pertencem a um passado bem distante. Você não tem outra opção além de esconder esses desejos no porão de sua mente e continuar vivendo.

Você passa a tomar três, quatro, cinco remédios por dia. Você deixa de ter cabelos brancos, mas, ao invés de voltarem a ter a antiga cor de nanquim, como você gostaria, eles deixam sua cabeça para sempre. Você percebe que as conversas com os seus amigos deixam de ser sobre trabalho, casamento e filhos e agora têm início com “você sabia que fulano morreu?”.

Você percebe que sua aposentadoria, que parecia tão recente, já tem vários anos, e que você ainda não fez nada do que gostaria de ter feito. No dia seguinte, você conta à sua esposa que comprou passagens para vocês dois passarem dez dias em Paris, para onde ela sempre sonhou viajar. Emocionada, ela lhe abraça e diz que não esperava que você se lembrasse das bodas de vocês, que será na mesma época da viagem marcada. Você realmente não se lembrara – Mas isso não é no aniversário de 50 anos do casamento? Eu não estou casado há 50 anos, estou? –, ainda assim fica feliz pela coincidência. O tempo passa rápido e você precisa fazer as malas. Logo chega o dia da viagem.

Você vai para o aeroporto. Você se lembra da primeira vez em que esteve ali, quando tinha vinte e poucos anos de idade e viajava sozinho. Naquela época, você se achava muito maduro, acreditava que sabia tudo, mas hoje você se dá conta que era apenas uma criança, que pouco conhecia do mundo. Você embarca no avião e percebe que ainda tem medo de voar. Você segura a mão de sua esposa e aperta-a durante toda a decolagem. Você nem se importa por ela rir de você, pois aquilo faz você se lembrar do aniversário de 18 anos dela, quando você, morrendo de medo, foi pedi-la em casamento ao pai dela. Neste momento, o riso dela é tão melódico e contagiante quanto foi naquela ocasião, e, mais uma vez, lhe dá coragem para enfrentar qualquer coisa.

Vocês finalmente chegam à Cidade das Luzes, fazem check-in no hotel e saem para conhecer as belezas diurnas. Sua mulher é artista, então você a leva a todos os museus que vocês conseguem visitar em uma tarde. Vocês voltam para o hotel e se arrumam para o jantar. Você a leva para a Torre Eiffel. Vocês têm uma noite maravilhosa e nem ao menos se importam com o preço absurdo do lugar. Vocês se beijam à luz da lua e voltam para o hotel de mãos dadas, mas as costas já não colaboram e começam a doer. O tempo passa mais rápido e vocês já têm que voltar. Por que você não tinha feito uma viagem dessas antes?

Você pede que seus filhos deixem todos os seus netos dormirem na sua casa no dia do seu aniversário. Conta-lhes histórias, brinca com eles e, à noite, junta seu colchão aos das crianças e dorme ao lado deles. Você tenta a todo custo recuperar todos os finais de semana que não passou com os pequenos que tanto ama. Deitado, recorda-se dos momentos da sua própria infância. Quão próximos eles estão nas suas lembranças, quão distantes no tempo, quão doces permanecem no seu coração.  Na manhã seguinte, você e eles fazem um grande café da manhã surpresa para os seus filhos. Observa cada um deles, homens e mulheres adultos. Quando eles se tornaram essas pessoas? Outro dia mesmo você os estava alimentando, trocando fraldas e brincando embaixo da chuva no quintal.

Você acorda um dia e sente mais dores. Você espera que elas sejam breves, mas descobre que elas pretendem juntar-se às antigas. Você vai a médicos e faz exames. Dessa vez, todos eles concordam: é câncer.

Você pode viver por mais alguns anos ou poucos meses, mas não faz diferença para você. Você está velho. Isso não significa que você viveu por muitas décadas, mas que você aproveitou cada momento de cada uma delas. Você fez com que eles valessem a pena? Você realizou muitos dos seus sonhos, você trabalhou a vida inteira, passou a vida ao lado de uma mulher maravilhosa e viu seus filhos e netos crescerem. Isso lhe basta? Você se assusta ao pensar na resposta, contudo não há mais tempo de responder. Não há mais tempo de planejar, nem de sonhar, nem de realizar, nem de viver.  Você poderia morrer neste momento. Você morreria feliz?




inteligência - fraude - divergências

 

Pode ser clichê que eu comece dizendo que escrevo estas palavras em um caderno de folhas amareladas, à lápis, em pleno 2023, em meio a tanta tecnologia, aparelhos e aplicativos – alguns até oferecem inteligência artificial para completar uma frase, ainda que eu prefira o padecer de pensar. Também não seria estranho que, em meio a tantos pensamentos, eu me questionasse sobre a inteligência – a minha própria. Ora, tantas vezes já debochei de mim mesma internamente por não entender muito sobre programação, mas achar que rabiscar alguns versos era inteligência. E, não é?

Não quero que me entendam mal, não sou uma destas pessoas alheias à tecnologia e às redes sociais. Estas, por vezes, me irritam e me sufocam, é bem verdade, entretanto ainda não consegui abandoná-las por completo e tornar-me, como dizem um dos muitos jargões em inglês utilizados contemporaneamente, uma pessoa “low profile”. Também não sou uma crítica ferrenha dos que leem em telas, apesar de eu mesma não conseguir fazê-lo de forma eficaz. Acredito que o fato de estarem lendo em meio ao caos de um mundo visto através de vídeos curtos já é uma glória, não tirar-lhes-ei o mérito.

Porque, SIM, qualquer leitura é importante. Percebo que soei como uma professora do ensino fundamental nesta fala, tentando argumentar com pré-adolescentes as razões pelas quais eles deveriam visitar mais frequentemente a biblioteca da escola. Bom, peço novamente que não me julguem, também é meu lugar de fala, já que leciono há catorze anos. Voltando à afirmação, é através da leitura que conseguimos escrever; é conhecendo as palavras, interpretando figuras de linguagem que conseguimos nos expressar melhor. Ah, e quantas vezes uma dúvida pairou sobre minha mente, questionando se isso realmente era inteligência ou mera obrigação. Sinto-me até envergonhada em dizê-lo aqui, sendo eu uma amante das letras.

A questão é que estamos muito acostumados a associar conhecimento como forma de gerar renda, apenas. Maldito capitalismo que corrompe nossa visão e tira o brio daqueles que são inclinados às artes! Que culhões tenho eu, perante o mundo, para dizer que a estrofe de um poema necessita de tanta inteligência para ser escrita quanto um código de programação? Chega a ser um sentimento de fraude, de autossabotagem ferrenha, mas que esconde lá no fundo uma certa razão.

Isso também não quer dizer que os versos de hoje em dia não despertariam a risada irônica de Lord Byron ou finalmente consumiriam (de raiva) o coração de Percy Shelley. A métrica, as rimas e os ritmos foram há muito esquecidos por aqueles que têm pressa de escrever uma frase instagramável em três linhas, vendendo-a como um devaneio disfarçado de poema. Perdoem-me, mestres da lírica, mas tais escritas são necessárias como iscas na tentativa de fisgar uns e outros e captura-los dentro do mundo da literatura.

Em um mundo de pressas, espantar-me-ei com aqueles que chegarem até este ponto do meu texto. Todos estão embriagados pela urgência do fazer, do ter e do parecer que mal têm tempo para sentir, quiçá expressarem-se. Cada linha conta, afinal. E eu, tão avessa a tais circunstâncias, me vejo impelida a retirar esses pensamentos daqui do papel e transferi-los para algum dispositivo, mostrando-os nas telas de alguns poucos leitores que se atreverão a mergulhar nas linhas e entrelinhas, esperando que um ou dois deles reflitam, ao menos, que palavras são arte, e arte é, sem dúvidas – mas com muitos julgamentos -  uma forma legítima de inteligência.




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